Por César Ferreira
Vivemos numa sociedade que anda mais com os olhos no chão do que nas estrelas. Adquirimos várias formas de ver e de interagir com os outros, mas, a meu ver, nunca estivemos tão desencontrados uns dos outros. Perdemos algures o que nos torna visíveis. Não é que não vejamos, mas não reparamos no outro. E isto faz-nos perder a especificidade que tanto nos caracteriza.
A inquietude dos dias, os encontrões numa rua movimentada, o trânsito caótico podem ser consideradas fontes de ansiedade, ou, então, são apenas oportunidades para parar, pensar e, quem sabe, talvez ponderar acerca de uma nova espécie de solidão. A solidão pela invisibilidade.
Nunca estivemos tão ligados. A tecnologia, por exemplo, permite a cada um de nós ligar-se a qualquer pessoa a qualquer momento. No entanto, o conforto da conexão demora a surgir. E por entre uma sociedade impaciente passeamos invisíveis. Flutuamos sobre um chão que nos incute uma certa cegueira.
À medida que escrevo este texto lembro-me de todos aqueles e de todas as coisas que, aos nossos olhos, passam despercebidos. Como os sem-abrigo, um idoso a atravessar uma rua movimentada em dificuldades, um animal ferido na estrada, um plástico no chão mesmo ao lado da reciclagem. Devíamos ser mais humildes e corajosos. Talvez o superpoder dos dias de hoje seja mesmo o da visibilidade. Aquele poder que transforma pessoas ocultas em pessoas visíveis.
José Saramago, no livro “O ensaio sobre a cegueira”, tem uma frase que expressa muito bem esta questão: “se podes olhar, vê. Se podes ver repara” (Livro dos Conselhos).
É da nossa responsabilidade não permitir que o Mundo se esvaia para o buraco negro da inexistência. É nosso, só nosso, o dever de tornar o Mundo visível.
A sociedade exige. É impaciente. Reclama uma velocidade, possivelmente, sobre-humana. Mas tendemos a continuar ao seu ritmo, feitos soldados a marchar ao som dos tambores. Contudo, nós somos essa sociedade de que tanto nos queixamos. A impaciência é somente uma consequência, um efeito de sermos invisivelmente visíveis.
A magia já não está em fazer desaparecer, mas em aparecer. Por isso, peço-te (e isto é mesmo um pedido pessoal) que apareças e que ajudes os outros a aparecer. Vamos dar voz, corpo e sentido às pessoas e às coisas. Vamos tornar tudo isto um pouco mais apetecível e caloroso.
Porque acredito que vivemos numa espécie de cegueira, não podia deixar de sugerir a leitura do livro “Ensaio sobre a cegueira” de José Saramago. Uma obra intemporal e que tem a capacidade de abrir os olhos a quem a lê.
Desejo-lhe momentos inspiradores.
Boas Leituras,
César Ferreira
Mentor de Autor, Mentor para a Aprendizagem, Biblioterapeuta