César Ferreira, Mentor de Autores
“Sermos compreensivos com a dor do outro é, para mim, uma bela forma de amar. Permitir com que alguém aconteça no seu silêncio, sem o abandonar, é amor, mas também um excelente porto de abrigo para quem pensa que o naufrágio está para breve”.
É absurdo o número de pessoas que, atualmente, tem colocado fim à própria vida.
Tem sido desolador, e muitas vezes inesperado, ver partir gente que, aparentemente, está bem.
O coração aperta e fica confuso, tamanha é a brutalidade da solidão que continua a matar e a assombrar, em plano século XXI, a sociedade.
A tristeza anda por aí camuflada tal como um ladrão que se esconde na penumbra. Encoberta pelos likes, pelas fotos em poses estilosas e pela falta de atenção aos pormenores da depressão.
Ao meu lado, ao seu lado, possivelmente há alguém que deixou de aguentar, faz tempo, a vida que tem. E a única coisa em que é capaz de pensar é como pode por fim a uma dor que exige a pouca energia que ainda resta.
A depressão também se alimenta das sobras. Ela suga tudo o que encontra, seja bom ou não. Não perdoa, não quer saber se estamos sozinhos e fragilizados. A depressão é um martelo que, ao cair sobre nós, pressiona todo o nosso ser contra o chão. E assim continua até que nada fique.
O mundo precisa de atenção.
As pessoas necessitam de atenção.
Acredito que todos temos algo a fazer para diminuir este flagelo.
Considero que estarmos mais atentos ao outro é uma boa estratégia. Observá-lo, fazê-lo sentir-se especial e acarinhado e, acima de tudo, demonstrá-lo que, por mais que a sua voz permaneça ausente pela dor aguda que sente, não está sozinho.
Sermos compreensivos com a dor do outro é, para mim, uma bela forma de amar. Permitir com que alguém aconteça no seu silêncio, sem o abandonar, é amor, mas também um excelente porto de abrigo para quem pensa que o naufrágio está para breve.
Portanto, quando ouvimos dizer que alguém colocou fim à sua vida, não creio que o tenha feito por opção, medo de viver ou mesmo por querer morrer. Acredito sim que, naquele preciso momento em que premiu o gatilho, o seu vazio era maior do que a sua capacidade de escolha.
Para quem já esteve, como eu, à beira de um ato desta natureza, sabe que não há palavras que sanem a dor cruciante que se sente nessa altura. Tudo foge ao nosso controlo e, das poucas coisas que nos podem salvar, é uma coincidência ou alguém que nos puxe à força para o lado de dentro da ponte.
A depressão é sorrateira, audaz e imprevisível. E talvez seja por isto que podemos parecer estar bem por fora, quando, no melhor dos cenários, o nosso interior está a ser consumido por pensamentos e emoções nefastos e indecifráveis.
Mas, se sentirmos a atenção dos outros sobre nós e que nos sabem interpretar sem questionar, as coisas tendem a melhorar. Pois somos escutados no nosso silêncio e não temos de estar preocupados em dar o primeiro passo.
Muitas vezes, oiço dizer que, para alguém se curar, tem de dar o primeiro passo. Na depressão, isso pode ser uma miragem. Precisamos que alguém o faça por nós, porque não estamos em condições de o fazer. E isso não é fragilidade ou falta de coragem, mas um ato de humanidade perante a minha condição de momento.
Que a atenção pelos outros seja cultivada e alimentada diariamente. Sem trocas, contrapartidas ou segundas intenções.
Todos nós estamos em posição de resgatar alguém da depressão e das suas consequências. Não basta ficarmos admirados quando lemos ou ouvimos dizer que a pessoa “A” ou “B” colocou fim à própria vida. Isso é tão pouco para o que nos compete.
Pelo sim, pelo não, partilho consigo alguns contactos importantes para uma situação limite:
Serviços telefónicos de apoio emocional e prevenção ao suicídio em Portugal: (ou) Se estiver a sofrer com alguma doença mental, tiver pensamentos autodestrutivos ou simplesmente necessitar de falar com alguém, deverá consultar um psiquiatra, psicólogo ou clínico geral. Poderá ainda contactar uma destas entidades:
SOS Voz Amiga (entre as 16h e as 24h) – 213544545 (Número gratuito); 912802669; 963524660
Conversa Amiga (entre as 15h e as 22h) – 808237327 (Número gratuito); 210027159
SOS Estudante (entre as 20h e a 1h) – 239484020; 915246060; 969554545
Telefone da Esperança (entre as 20h e as 23h) – 222080707
Telefone da Amizade (entre as 16h e as 23h) – 228323535
Todos estes contactos garantem anonimato tanto a quem liga como a quem atende.
No SNS24 (808 24 24 24 – depois deve selecionar a opção 4), o contacto é assumido por profissionais de saúde. A linha do SNS24 funciona 24 horas por dia.