Cristina Amaro
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O LUXO e o tempo

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O LUXO e o tempo

Não há tempo para perder tempo. Vivemos a um ritmo acelerado sob a tirania de prazos apertados. O rápido bate o lento e a velocidade e a adrenalina tornam-se um vício. Mudamos a um ritmo vertiginoso, como se estivéssemos sempre à procura de algo maior do que a própria vida. O efémero e o descartável caracterizam tudo aquilo que adquirimos e em que procuramos gratificações instantâneas. Até os pequenos e saudáveis momentos de puro tédio, que nos recordam os longos verões da nossa infância em que o tempo custava a passar, são agora ocupados por qualquer aplicação de um smartphone.

Para muitos, tempo é dinheiro!

Para outros, ter tempo é o derradeiro e verdadeiro luxo!

O luxo é muito daquilo que nos escasseia e o tempo é, efetivamente, um bem escasso porque nos é finito. Podemos vender tempo, mas dificilmente poderemos comprá-lo. Para aqueles que tudo têm, o tempo revela-se, por isso, um bem ainda mais precioso. Um bem sem preço.

A relação que o luxo tem com o tempo é profundamente reverencial, já que o luxo, sem tempo, não existe.

O luxo exige tempo para a criação de obras de exceção.

É necessário tempo para que a Natureza faça o seu milagre e nos brinde com as pérolas mais perfeitas para as joias mais preciosas, com a melhor caxemira para nos aconchegar, com as melhores peles para as carteiras mais macias. É preciso tempo para moldar, dias a fio, um sapato que se quer perfeito, anos para enriquecer um vinho de potencialidades, décadas para aperfeiçoar a arte do “saber fazer” de um relojoeiro que passa de geração em geração, em cada movimento, em cada criação complicada.

Há artesãos que levam uma vida a aprofundar uma técnica, um simples gesto.

Um dos grandes desígnios do verdadeiro luxo é, justamente, a garantia de que o tempo nos revelará objetos de exceção duráveis e intemporais.

O luxo precisa, também, de tempo para ser desfrutado.

O ser humano é o único animal com a capacidade de contemplação. Aprecia o belo, a sensualidade dos objetos, a partilha de bons momentos… Por isso, o luxo está cada vez mais associado a lifestyle. Tentamos incluí-lo em tudo o que fazemos, para podermos usufruí-lo quando o tempo escasseia. A ociosidade não pode ser desassociada do luxo, justamente porque é necessário tempo para deleitar os sentidos, para procurar um objeto raro numa boutique recôndita, para desenhar na nossa imaginação uma peça que nos encante, para viajar sem pressas…

Os verdadeiros sonhos não têm de ser satisfeitos de imediato! O prazer está, também, na procura e na espera.

O luxo respeita ainda o tempo da modernidade.

Através da inovação e do design, o luxo insere a sua tradição no tempo presente, que é também o seu, garantindo assim atualidade, vitalidade e pertinência.

O luxo respeita, por fim, o tempo de quem não tem tempo.

Se é verdade que necessitamos de tempo para que o luxo nos presenteie com as mais sublimes criações, inversamente, na prestação de um serviço de luxo, o tempo que nada acrescenta de prazer deve subtrair-se. O tempo de espera, o tempo administrativo, o tempo logístico. O tempo de quem não tem tempo é precioso, efémero e tão delicado como um colar de pérolas, que, uma vez quebrado, as vê precipitarem-se pelo fio e se perderem irremediavelmente.

A relação umbilical e de legítima reverência entre o luxo e o tempo muito nos ensina. Aprendamos nós a acrescentar mais tempo ao nosso tempo, deixando simplesmente de o usar para o usufruir. À força de tanto preenchermos as nossas vidas, ficamos com a sensação inquietante de que o tempo se nos escapa com maior rapidez, quando, na verdade e paradoxalmente, somos, na História da Humanidade, das gerações que mais tempo vivem. Olhemos para o relógio, que no luxo é, já de si, um objeto de arte, e marquemos um novo tempo, um novo ritmo. Desliguemo-nos da corrente. O melhor tempo da vida e as melhores ideias surgem quando o nosso cérebro está numa espécie de “ponto morto”. Tenhamos esperança de que, não fazendo nada, voltemos a fazer o que realmente é importante.

Luxo é também tempo de Celebração. Um Santo Natal!

Mónica Seabra-Mendes é Coordenadora do Programa Executivo de Marketing de Produtos e Serviços de Luxo, da Universidade Católica de Lisboa.

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